Tratamento endovascular de hemoptise relacionada à sequestro pulmonar

AUTORES
Daniel Kanaan1, Carlos Augusto de Oliveira Motta1, Antônio Carlos Coutinho Júnior2
1 – Kanaan e Motta Radiologia Intervencionista e Cirurgia Endovascular, Rio de Janeiro – RJ
2 – Centro de Diagnóstico por Imagem (CDPI), Rio de Janeiro – RJ
RELATO DE CASO
Paciente do sexo masculino, 49 anos de idade, previamente hígido, com antecedente de hipertensão arterial leve, sem outras comorbidades, em uso diário de tadalafil em baixas doses para tratamento da disfunção erétil.
Apresentou quadro de hemoptise maciça durante uma caminhada, sendo encaminhado para emergência. Foram realizadas medidas de suporte de vida e realizada tomografia de tórax que identificou área sugestiva de sequestro pulmonar na base pulmonar direita (Figura 1).
O exame foi complementado com uma angiotomografia do tórax, que demonstrou malformação vascular com componentes arterial de vaso anômalo, se originando a partir da aorta infradiafragmática; parenquimatoso e venoso de ramos da veia pulmonar direita (Figuras 2 e 3). Levantou-se a hipótese diagnóstica de sequestro pulmonar (SP).
Foi suspenso o tratamento com o Tadalafil e o paciente permaneceu em repouso absoluto, com persistência de hemoptóico e tosse seca. Exames laboratoriais sem evidências de infecção.
Devido aos achados tomográficos e persistência da hemoptise foi solicitada arteriografia com embolização.
INTERVENÇÃO
Realizado acesso arterial femoral comum direito com implante de introdutor valvulado 5F, seguido de cateterismo com cateter Mikaelson 5F do vaso anômalo.
A arteriografia evidenciou: calibroso ramo arterial nutridor e ramos terminais tortuosos; intenso blush parenquimatoso e retorno venoso precoce através de ramos hipertrofiados e tortuosos da veia pulmonar direita (Figuras 4, 5 e 6). Não foi possível descartar componente fistuloso artério-venoso.
Realizou-se cateterismo distal com microcateter 2,3F e microguia 0,016” (Figuras 7 e 8). E, optou-se por realizar embolização com micromolas 0,018” fibradas. Foram necessárias a utilização de 6 micromolas para o completo fechamento na nutrição arterial da lesão (Figuras 9 e 10).
Optou-se ainda por não utilizar partículas de polivinilalcool (PVA) ou adesivo tissular, uma vez que não foi possível descartar componente fistular artério-venosa direto associada à lesão.
Realizou-se também angiografias das artérias brônquicas que não demonstraram nenhuma anormalidade.
Evolução:
O paciente recebeu alta no dia seguinte, assintomático e sem queixas. Apresentou dor pleurítica de moderada intensidade três dias após o procedimento, sendo iniciado AINEs. Não apresentou qualquer evidência de sangramento subsequente até a presente data.
DISCUSSÃO
O SP é uma malformação congênita representada por uma área de tecido pulmonar não-funcional e não-comunicante com a árvore brônquica, sendo nutrida por uma ou mais artérias sistêmicas. Geralmente é classificado em sequestro intralobar ou sequestro extralobar. De acordo com Pryce, existem três tipos de SP (tipo I: a artéria sistêmica irriga um segmento de pulmão normal, sem sequestro pulmonar; tipo II: a artéria sistêmica irriga a área de pulmão sequestrado em conjunto com uma área de parênquima normal adjacente; tipo III: a artéria sistêmica irriga apenas o tecido pulmonar sequestrado).
Em adultos, o SP pode se apresentar como achado de exame de imagem ou associado a quadro de infecção ou de hemoptise.
O sequestro intralobar encontra-se dentro da pleura do pulmão normal e é o mais comum dos dois tipos de SP. É mais comumente encontrado nos lobos inferiores e recebe suprimento arterial sistêmico a partir de ramos da aorta torácica ou da aorta abdominal. A drenagem venosa geralmente ocorre para as veias pulmonares. Apesar de ocorrer um shunt esquerda-esquerda no sequestro pulmonar, não são claramente identificadas fístulas arteriovenosas microscópicas ou macroscópica. A malformação arteriovenosa pulmonar é uma entidade diferente, embora alguns autores considerem como uma variante do SP.
No SP, a hemoptise ocorre como um resultado do aumento da pressão sistólica e diastólica das artérias sistêmicas que irrigam o tecido anormal, aumentando assim a pressão capilar. A hemoptise geralmente não é maciça, e pode estar frequentemente associada com pneumonia.
Os exames de imagem desempenham um papel importante na avaliação diagnóstica do SP. A demonstração de irrigação do tecido anormal por uma artéria anômala é importante para fazer o diagnóstico. A angiotomografia ou angiorressonância magnética são eficazes em demonstrar o vaso sistêmico anômalo e fornecer informações anatômicas para o planejamento cirúrgico ou intervencionista. A angiografia digital raramente é necessária para o diagnóstico.
O tratamento convencional para o sequestro pulmonar tem sido a remoção cirúrgica do tecido ou lobectomia, que estão associados a taxas não desprezíveis de morbidade e complicações. A embolização é uma técnica alternativa para o tratamento sintomático de sequestro. A embolização do SP em adultos tem sido esporadicamente documentada na literatura. Pensa-se que a embolização provoca trombose da artéria nutridora, o que resulta em perfusão reduzida, perda de vascularização e infarto progressivo do tecido pulmonar anômalo, o que finalmente o torna fibrosado. Isto leva a uma redução no tamanho do sequestro e por vezes a sua involução completa.
O tratamento endovascular é menos invasivo do que toracotomia e tem uma menor incidência de complicações. As molas são os materiais mais utilizados para este tipo de embolização. Outros materiais utilizados são partículas de PVA, adesivo tissular, álcool absoluto ougelfoam. Não há consenso de quando repetir o exame de imagem após a embolização. Tendo em conta o fato do paciente estar assintomático, optou-se por realizar tal controle após 1 ano.
CONCLUSÃO:
O tratamento endovascular do SP em adultos é seguro e eficaz nos casos associados a hemoptise. Sua utilização nos casos associados a infecção é controversa, sendo a cirurgia convencional o tratamento de escolha. Não há consenso na literatura quanto ao tratamento cirúrgico ou endovascular em adultos assintomáticos. O agente embolizante de escolha são as molas, tendo em conta os riscos relacionados a migração de agentes particulados ou líquidos para a veia pulmonar.
REFERÊNCIAS
1) Leoncini G, Rossi UG, Ferro C, Chessa L. Case report – Pulmonary Endovascular treatment of pulmonary sequestration in adults using Amplatzer vascular plugs. Interactive CardioVascular and Thoracic Surgery. 2011 Dez; 98-100.
2) Mohapatra M, Mishra S, Jena P. Massive Hemoptysis in a Case of Intralobar Pulmonary Sequestration Associated with Pulmonary Hypoplasia and Meandering Right Pulmonary Vein: Diagnosis and Management. Case Reports in Pulmonology. 2012; 1-5.
3) Madhusudhan KS, Das CJ, Dutta R, Kumar A, Bhalla AS. Endovascular Embolization of Pulmonary Sequestration in an Adult. JVIR. 2009;12:1640-1642.









